26 dezembro 2008

LOVE




"Alguns leitores pensam, equivocadamente, que tenho formação psicanalítica. Não me importo, ao contrário, me sinto lisonjeada, sinal de que confiam nos meus palpites de leiga. Por causa dessa confusão de papéis, de vez em quando alguém me escreve contando suas dores de amor e termina fazendo uma perguntinha prosaica: "Como é que eu esqueço o desgraçado?" Se eu tivesse o topete de me meter, diria que o primeiro passo é desejar esquecer mesmo, coisa que quase ninguém quer. Pô, depois de tantas ilusões e tantos bons momentos vividos, esquecer tudo seria como cair no vazio. Melhor ficar por um tempo com a companhia da dor, que ao menos preenche a vaga que foi aberta. Porém, mais dia, menos dia, todos se fartam de sofrer, e aí só tem um remédio: investir num novo amor. É o que eu respondo pra encurtar a conversa e não ser preocessada por charlatanismo, já que essa minha dica é um clichê de domínio popular.
De fato, um novo amor, sendo amor mesmo, é o que funciona para quem quer partir para outra. O probleminha está nesse "sendo amor mesmo", já que raramente é. Às vezes, a gente sabe desde o início que o tal novo amor é apenas um passatempo, um elixir contra a solidão. Se você for do tipo que não olha pra trás, que leva tudo numa boa, que tem como esporte preferido fazer a fila andar (seja com quem for), boa sorte, está salvo. Mas se isso for apenas uma fachada e no fundo você for hipersensível, esse novo amor pode ter um efeito contrário: confirmar a força do amor anterior.
Até parece fácil. Um amor se vai e a gente grita da janela: próximo! Só que esse próximo vai te beijar de uma maneira diferente, vai ter um papo diferente, vai ter hábitos diferentes. Animador? Sei não. Isso tudo pode apenas te entorpecer em vez de te curar. Se a relação que terminou tiver sido muito forte e séria, essa troca de bastão instantânea pode gerar uma saudade absurda daquele que se foi. Vale a pena correr o risco?
Tudo é risco na vida, mas, nesses momentos, prefiro ficar na minha. Claro que não coloco um cinto de castidade e me fecho para o mundo - se por um acaso surgir alguém que me desperte a imaginação e os hormônios, quem sabe? Mas não procuro nada. Não ligo o radar. Não saio pra noite. Não fico na fissura por uma substituição imediata. Aproveito a entressafra para matar saudade de mim mesma, já que em toda relação a gente esquece um pouco de si, se doa, contemporiza, regateia, em alguns casos até inventa um personagem. Sozinha, eu não preciso fazer concessões nem imposições - não é preciso negociar. Vou perder uma oportunidade rara dessas?
Norman Mailer certa vez escreveu: "As pessoas procuram o amor como solução para todos os seus problemas, quando na verdade o amor é a recompensa por você ter resolvido os seus problemas." É isso aí. Primeiro aprenda a administrar seus conflitos e tristezas, aceite suas oscilações de humor, busque a serenidade, fortaleça sua auto-estima e ampare-se em si próprio, sem se valer de bengalas emocionais. Aí sim, feito o dever de casa, seu prêmio estará a caminho."
Martha Medeiros

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